segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Último Suspiro

Era o último dia de carnaval. Na verdade, já era quase noite. A manhã seguinte traria a quarta-feira de cinzas, aquela ressaca acumulada e uma ligeira sensação de "podia ter sido melhor se..." e no "se" ela parava. Era melhor nem pensar nisso.

O sol já se deitava, mas na rua a folia ainda não tinha hora pra terminar. As pessoas fantasiadas cantavam e dançavam ao ritmo da batucada carnavalesca, sem ligar para o calor, o suor e a sujeira ao redor. Ela olhava para os próprios pés nos chinelos, imundos daquele chão de poeira, cerveja, confete, e outros detritos que ela preferia nem mencionar. Mas apesar de tudo tinha sido bom. Saíra nos blocos com os amigos em todos os dias. Machucara o pé pulando alegremente e da garganta a voz saía rouca. Mas tinha sido ótimo. E teria sido maravilhoso, se...

Ela tentava. Tentava muito, mas não conseguia não pensar. Nele. O idiota mais idiota, irresponsável e inconsequente. Aquele que só a magova e fazia seu coração sofrer. Com quem ela jamais deveria ter se envolvido pra início de conversa. Ela o odiava com todas as suas forças. Mas o amava, apesar de tudo. Fazer o quê? O coração não pensa...

Desistiu de tentar. Imaginava-o curtindo o carnaval completamente ébrio na companhia de loiras e ruivas sensuais, sem nem lembrar de sua existência, uma simples morena de cara amarrada. Ai, como ela sofria. Mesmo querendo não sofrer. Procurando esquecer o momento em que se apaixonara por ele. Mas como poderia? Aquele dia estava tão bem guardado em sua memória. Bastou uma troca de olhares para mudar tudo. O que vinha a ser uma grande amizade transformou-se para sempre no momento em que os lábios dele tocaram os dela. E ela sabia que dessa vez seria diferente. E foi. Ela se apaixonou; perdidamente. E desde então se arrepende.

Mas era carnaval. O último dia de carnaval. Ela deveria estar contente, cantando e dançando junto aos amigos. Mas seu coração não pulava mais. Seus pés não deixavam mais o chão. Despencara das nuvens tão fortemente que faltava pouco para ela deixar-se cair por completo e ficar ali, abandonada, no chão duro e sujo da realidade cruel.

A música estava muito alta e ela não ouviu o celular tocar. Seus amigos tinham encontrado outros amigos ou foram comprar mais bebida. De repente viu-se só no meio daquele bloco. O último suspiro de festa no último dia do carnaval. Soltou seu último suspiro. E quando olhou pra frente, ele estava bem ali, caminhando em sua direção, sorrindo. E antes que pudessem dizer qualquer coisa, a marchinha cantou mais alto:

"Vou beijar-te agora
não me leve a mal
hoje é carnaval"

E aquele carnaval não terminou em melancolia.

2 comentários:

Sam disse...

Devo suspeitar de acontecimentos recentes?

Laís Ramos disse...

Devo suspeitar de acontecimentos recentes? [2]
Vc é foda! Amo tudo o que escreve!